quinta-feira, 22 de maio de 2014

Menção honrosa da coletânea de 2013 fez uma homenagem à escritora Ruth Guimarães

A escritora Ruth Guimarães
A escritora Ruth Guimarães, falecida nesta quarta-feira (21) com 93 anos, em Cachoeira Paulista, onde nasceu, foi homenageada na publicação da coletânea de contos e poesias do 1º Prêmio SFX de Literatura. Ruth Guimarães deu nome ao título de 'Menção Honrosa' oferecido a autora do melhor conto da obra, Maria Beatriz Del Peloso Ramos. 

Na mesma coletânea foi publicado um conto da autora, 'Duas Mães', que originalmente fez parte do livro 'Contos de Cidadezinha' (Lorena: Centro Cultural Teresa D'Ávila, 1996). "Foi uma satisfação muito grande poder contar com participação da escritora Ruth Guimarães na coletânea e, com certeza, ela vai fazer muita falta ao mundo literário", declarou o empresário Cristovão Cursino, organizador do prêmio.

Confira abaixo o conto publicado:

Duas Mães

Conto originalmente publicado no livro “Contos de Cidadezinha”,
Lorena: Centro Cultural Teresa D’Ávila, 1996.

“Mãe” (que a carta dizia). “Mãe, peço a sua bênção, em primeiro lugar. A senhora não calcula o desespero e é só para a senhora que eu tenho coragem de escrever e de pedir, nesta hora de agonia. Eu sei que não devia invocar perdão nem ajuda, e nem pensar que quem é mãe perdoa tudo, eu, que na hora da loucura, não soube ver a face da minha filha. A lembrança ainda amarga até agora. Não vai sair mais do meu pensamento, eu sei. A minha filha, dormindo na caminha, e eu saindo, ah! mãe, para a perdição. E eu deixando a coitadinha. Ela vai crescer me desconhecendo e me maldizendo, cuidada por mãos alheias... A senhora me perdeu! Mãe vai cuidar da coitadinha, disse comigo, ela fica bem, vai ser muito amada, ter avós, e pai. E eu não tinha nada, só a minha paixão infeliz. É verdade que eu sobrava na minha casa, como a senhora sabe, e não fiz falta, mas não foi isso. Fui arrastada pelo destino. O melhor era a menina ficar. Durante o dia, a cada momento, eu ia e vinha pela casa, parava na frente dela. Ainda me lembro, em certa hora, abracei a pobre, de um abraço tão apertado! Primeiro ela olhou pra mim e depois, não sei o que terá visto no meu rosto, caiu no choro. Tão sentido! Foi assim o dia todo, ela assombrada. Eu não podia levar a minha filha, para só Deus sabe que tristezas. Descabeçada mulher, amaldiçoado passo. Outro homem ia gostar dela mais do que o pai? Podia eu impor a essa inocente a minha morte incerta e o temor que me apertava o coração? O que sofri por ter deixado a filha, isso não se conta. A senhora compreende. Entretanto, eu mesma certas coisas não entendo. Não sei que coisa-ruim me puxava. Não queria sair e não via a hora de correr, de voar, para onde me chamava sangue alvoroçado. Esperei minha filha dormir. Ela parece que adivinhou. Andava atrás de mim, de olhos marejados. Não olhe pra mim desse jeito, menina! Nunca me viu? eu gritei. Ah! não! dei um tamanho safanão nela, e nunca mais esqueço do susto nos seus olhos. Eu estava louca. Assim que ela dormiu, saí. Saí sem olhar para trás. Tinha tanta raiva, tanto medo, o choro me ficou trancado na garganta.
Há muito tempo, não posso mais chorar. Mãe, a senhora me perdoa, a senhora me receba, estou arrependida, quero acertar minha vida, quero ser o que era, estou arre-pendida, mãe, se remorso matasse... Vou trabalhar tanto e proceder tão bem, que a senhora não vai ter aborrecimento comigo. Se ninguém me der a mão, o que será de mim? Mas tenho fé em Deus que a senhora não vai me deixar nesta amargura?”

O marido levantou da mesa, pegou o copo, brincou com a torneira da talha. Perguntou:
— É da Maria?
— É.
Bebeu a água.
— Que é que se há de fazer?
Aí reparou na expressão da mulher.
— Que é que ela quer? Que é isso? Que foi?
A mulher desabou sobre a mesa e ele tomou-lhe a carta das mãos crispadas.
Os dias eram difíceis de passar, com aquela carta entre eles. Mas, antes dos dias, tiveram que tecer o fio das horas. Em meio à conversa cotidiana, Maria estava presente, como se jamais houvesse casado ou fugido. De súbito vinha o pensamento da carta. Conhecia-se o sorrateiro da chegada, pela expressão do rosto e a perturbação do olhar da mãe. Ela mantinha a expressão concentrada. Nas linhas da face estava o sofrimento.
— Venha cá, ó Matilde - disse ele, por fim. — Afinal, não é uma coisa do outro mundo. Ela quer vir, não quer? Deixe-a vir e está acabado. Não é minha filha, mas é como se fosse. Fica a moça aqui, pois em casa do Evaristo ela não pode entrar mais, depois do que fez. Oh! diacho! Uma menina que cresceu aqui e era uma boa menina, isto afianço. E foi leal, com os diabos. Podia ter ficado em casa e fazer como tantas. Ficava com o Evaristo e punha-lhe cornos. Arriscou tudo e perdeu a parada. Menina de coragem, sim senhora! Sabe que mais? Gosto dela. Mande vir a pequena e coração à larga.
Parou de falar. A mulher estava chorando novamente. Seu Zé Rodrigues baixou a voz sem querer.
— Você vê o que faz. O que fizer, está direito para mim.
Podia entender o sofrimento da mulher (sem uma queixa), feito de tanto ressaibo impuro, principalmente de ressentimento contra a filha, tão buliçosa e alegre. E agora isto.
— É uma vergonha - disse ela, em voz baixa. - Todo o mundo fala.
— O que lá foi, lá foi. Deixe o mundo.
— Se ao menos eu tivesse certeza de que ela vinha e... e dava certo.
— Por que não dará certo? Homessa! Por mim? Bem sabe você não tenho nada contra a pequena e não sou homem de preconceitos.
— Não é isso. Como se pode saber do procedimento dela daqui pra frente?
— Ah! Isso...
O homem pareceu desnorteado por um momento.
— É uma boa moça. Não cabe a mim resolver, padrasto nunca tem voz ativa. Ainda mais num caso desses. Diabo, Matilde! Deixe vir a moça, não se perde nada com isso.
— É o que você pensa.
Seu Zé encolheu os ombros e desabafou:
— Raio de complicação! - Olhou para a mulher, com certo mal-estar. — Como terá coragem de negar? Em nome de que leis humanas, de que costume, de que imposições sociais? Contra a lei do coração. Fosse minha filha, não teria coragem de a largar ao léu. Deixe de dureza.
— Você diz isso, justamente, porque não se trata de sua filha.
— Tem razão - concordou o homem. De repente, vira até que ponto estava ferida a pobre Matilde e como amava a filha, para estar assim, atormentada e ressentida.
— É. Você tem razão. Mas a Maria é como quem está se afogando. Estende-se-lhe a mão, sem cogitar se será salva para praticar outras tolices. Que temos nós com os outros, o que vão falar?
— Não é pelo que vão falar, você não entende?
— Entendo, entendo. Não se ponha a chorar novamente. De que adianta isso? Quer saber de uma coisa? Vá falar com o Padre Joaquim. Aconselhe-se com ele. Eu não digo mais nada. Fale ao padre, mas não chore mais, ahn? Ahn? E então?
Dona Matilde, limpando os olhos com as costas da mão, acenou com a cabeça e ele ficou em dúvida, se o conselho tinha sido aceito. Mais tarde, viu a carta de Maria, dobrada dentro do livro de reza, no criado-mudo.
Seu Zé Rodrigues imaginou se fizera bem em sugerir tal coisa à mulher. Era católica praticante, muito dócil às recomendações do vigário, cumpria o preceito. Ele, o padrasto, não podia tomar partido. Tinha sido contrário ao casamento, sem se manifestar. Não era o pai. Não tinha nada contra o rapaz, que diabo, que era bom partido, trabalhador, boa família, simpático, a Maria gostava dele, que havia? Era um pressentimento, como agora, a lhe apertar o coração. Tomara isso como natural temor do pai que vê casar a filha. Afinal, o casamento não havia mesmo dado certo, Maria se fora, tão doida, tão apaixonadamente, naquela sua maneira impulsiva e ousada de fazer as coisas. Era leal à sua maneira. E agora, cada vez que se lembrava dela, não era da moça, nem da noiva por ele próprio levada ao altar para entregá-la ao noivo e, tão linda! mas da pequenita gorducha, que engatinhava pela casa gorjeando. Virou-se para olhar para a mulher. Perfil reto, olhos fundos, calada. Esteve para tirar a carta de dentro do livro de reza. Era tarde. De qualquer maneira, ela iria, cedo ou tarde, levar os problemas ao confessionário. Seu Zé encolheu os ombros. Padre Joaquim teria que dar um conselho em conformidade com a caridade cristã. Lembrou-se da alegre Maria, dos risos soltos pela casa, a figura ascética do padre, da agonia calada de Matilde. E temeu por Maria.

O padre olhou sombrio para a mulher parada à porta da sacristia.
— Desejava falar comigo, senhora Matilde?
— Sim senhor, o senhor...
— Assente-se, Dona Matilde.
— Era para um particular, padre Joaquim, e aqui...
O sacristão entrou com o apagador na mão. Os coroinhas abriam gavetas, guardando os paramentos. Um homem de preto veio pôr um livro grande sobre a mesinha, quase diante deles. O padre fez um aceno para a mulher, com a cabeça, e passou para a frente. Desceu os degraus da sacristia, atravessou em largas passadas a pracinha. Seus passos rechinavam na areia. Ele caminhava absorto, o rosto agudo cortando o ar frio da manhã, barco solitário. O vento passava em lufadas rudes. Atrás, a mulher arrastava os sapatos. A saia negra descrevia desenhos alucinados em torno das pernas da mulher, no mesmo ritmo da sotaina. O seu rosto era pálido, terroso, mais escuro que o do padre. A testa mais abaulada, repuxada pelos cabelos lisos, enrolados num coque. Ele olhava para a frente, ela para o chão. Dele o andar era determinado, o dela frouxo.
A ampla sala deserta, assoalhada com tábuas largas, dava a impressão de muito lavada. Janelões abriam para o pátio onde uma figueira estendia os braços imensos. De um lado, viam-se as escuras laranjeiras de enxerto. O cheiro das flores vinha ativo, picante.
— E então, senhora Matilde?
A mulher abriu com mão trêmula o livro de rezas, sob o olhar do padre. Estendeu-lhe a carta. Enquanto ele lia, trançou fortemente os dedos, com os olhos baixos e a respiração acelerada.
Padre Joaquim devolveu a carta aberta. Ela dobrou o papel cuidadosamente demais, alisou a folha, colocou-a outra vez no livro. Cruzou as mãos, esperou. Padre Joaquim perguntou novamente:
— E então, senhora Matilde?
Aguardou um pouco:
— Mas sente, sente, senhora Matilde.
Esperou ainda um instante:
— Com que então vossemecê tenciona trazer essa mulher, para sua casa?
— Não, Padre, quer dizer, eu...
— Ora, minha senhora, vejo-o pela sua hesitação. Se não estivesse resolvida a acolhê-la, não viria aqui, em busca de uma aprovação que não estou disposto a dar-lhe.
— Padre...
— Se fosse uma mocinha, senhora Matilde, vá lá, que não tinha experiência, mas uma senhora casada, peca com conhecimento de causa. Que sofra as conseqüências de sua leviandade.
— Padre! Que lhe fiz?
— Vá com Deus! - Vendo que ela nada mais dizia, acrescentou em voz mais branda: — Que Ele a ilumine e fortaleça.
— Padre, é minha filha, eu não tenho coragem.
— Ela já foi e vossemecê sofreu uma vez por ela. Agora, que as coisas caíram no esquecimento e que não se fala mais nisso, ela vem outra vez e o escândalo acompanhará os seus passos. Se o teu olho te escandaliza...
— Mas padre...
— É para o bem dela, minha senhora. Vendo que ninguém lhe dará apoio e que terá que viver uma vida de pureza para ser aceita, se regenerará. A impunidade gera outro crime. Quem bem ama, castiga, e assim é Nosso Senhor. São provações pelas quais te-remos que passar. O que não podemos é afirmar nossa cumplicidade. Por essas molezas do coração é que se vê a dissolução da família. Conto com a senhora para darmos um exemplo.
— É minha filha - ela repetiu com voz abafada.
— Sim. E vossemecê a educou bem, num lar católico. Vi-a fazer a primeira comunhão. Ouvia-a em confissão, era de uma pureza que consolava. Que coisa triste, senhora Matilde, ver como a vida vai marcando a alma de uma criança! - Ao dizer isto, seu rosto escureceu. — Foi depois do casamento que ela mudou. Andava atormentada. Era já o pecado que lhe aferrava as garras. Pôs-se a fugir de mim. Ah! Ah! A fugir. E era uma menina talhada para o convento. Que rosto puro, que suavidade, sob o véu de filha de Maria! Que tivesse casado, vá lá. Nem todos podem deixar o amor humano de lado. Mas que depois se dispusesse a amar a outro e a segui-lo, ela, senhora Matilde, isto não tem perdão.
A mãe olhou espantada para ele.
— Que lhe fizemos?
— Pôs-se a fugir de mim - disse o padre. — De mim que queria trazê-la para o bom caminho. Dei-lhe uns conselhos, ela lhe contou?
Dona Matilde fez que não com a cabeça, olhando fascinada o rosto do padre, que parecia entrar em zonas de luz intensa e de penumbra, sucessivamente. Dir-se-ia que estava ora em êxtase, ora nas labaredas do inferno.
— Dei-lhe conselhos e ela (já estava nas garras do demônio!) riu-me na cara. Não se riu do que falei, riu-se de mim, a senhora entende? e falou escarnecendo: “Seu santarrão do pau-oco! Eu te entendo. Eu te conheço!” Não me ofendi. Não. Não me ofendi. Abomino o pecado, mas amo o pecador. Disse-lhe com toda a brandura: “Ora, Maria, levo uma vida irrepreensível.” E ela me disse gritando que não falava da minha vida, mas de mim, como pessoa. Que eu não a enganava. E tudo isso com uma expressão descarada, torcendo o lenço nas mãos, comprimindo os lábios, apertando os olhos, e estava mais bonita ainda do que sob o véu de filha de Maria. Tudo ciladas do demônio. Eu, senhora Matilde, a mim, o demônio tocou. É por isso que lhe digo: ela deve sofrer muito, para se purificar.
Inclinou-se sobre a mulher assombrada:
— Sofrer muito, entende?
— Ah! Padre...
— Reze, senhora Matilde, reze! Para a execução da vontade do Senhor, é preciso voltarem-se pais contra filhos e filhos contra pais. Eu não vim trazer a concórdia, mas a luta...
— Oh! não...
— E que Sua Santa Vontade seja feita, mesmo que tenhamos de sofrer em nossa carne, neste mundo, os tormentos do inferno. Eu sofro, senhora Matilde, em mim, aqui, os tormentos do inferno.
Dona Matilde ia falar. Olhou para o rosto severo, o pálido rosto severo do padre Joaquim. Ele estava de olhos fechados. Seus lábios se moviam, numa imprecação silenciosa. Ela teve medo e fugiu, como se também tivesse visto a face do demônio.

Quando ela contou ao seu Zé Rodrigues, ele aliviou a tensão imediatamente, gritando:
— Que experiência, que nada! Esse padre é bobo! De que é que Maria tem experiência?! É uma menina, casada com um pasmado!
— Zeca, o que é isso! Não fale dos padres. Eles aprendem a conhecer as almas. São assistidos pelo Espírito Santo.
— Bobagem, Matilde, que bobagem! Quem acredita nisso? São homens como os outros. Ainda menos, porque são castrados.
— Zeca!
— Que é que eles entendem da vida de casado, de paixões, de tudo? Eu sempre digo que os padres deviam casar-se. De paixões, você disse? Fui eu que disse? Maria gritou que ele é um santarrão do pau-oco? Conta de novo pra mim essa passagem. Eu sempre digo que os padres deviam casar-se.
Dona Matilde apertou os lábios.
— E depois, Matilde, que desumanidade! Jogar a moça na rua!
— Como, jogar? Jogar, não, foi ela.
— Sei, sei, foi ela. Saiu porque quis. Estava bem, tinha tudo. O marido um pão de bondade. Que é que você e mais o seu padre sabem a respeito disso?
Dona Matilde não pôde ouvir mais nada. Foi para dentro horrorizada e seu Zé Rodrigues ainda clamou irônico:
— E ainda falam de caridade! Pro inferno com a vossa caridade!
Mais tarde, seu Zé arrependeu-se. De que adiantava falatório? E que tinha ele com isso? Que tinha o padre contra Maria?
— Que é que eu tenho com isso, afinal? Diga-me! Você faz o que quiser, mulher. Resolva logo, que não quero falar mais nisso.
A resposta de Matilde foi-lhe uma surpresa.
— Maria é moça e bonita. Tem quem defenda, tem quem ajude. Comigo que fico em casa e cumpro a minha obrigação, ninguém se importa. De mim ninguém tem pena. Até o sofrimento é motivo de aborrecimento e importunação para os outros.
Seu Zé Rodrigues abriu e fechou a boca, mas não disse mais nada.
Nessa tarde a filha mais velha de dona Matilde chegou também com uma carta de Maria.
— Ela quer vir pra minha casa, já que a senhora não quer que ela venha pra cá, mãe. Diz que a senhora não respondeu, quem sabe é por causa do seu Zeca. Que a senhora não tinha coragem de fazer uma coisa dessas pra ela.
— E você?
— Eu não posso. O João não consente. Assim mesmo, estou pelo que a senhora disser. Hein, mãe? Se eu implorar, o João, a senhora sabe...
Dona Matilde olhou sombria para o rosto ansioso da filha.
— Eu escrevo pra ela. Quando foi embora não conheceu mãe, nem irmã, nem filha, nem marido, nem sociedade. Não pensou em ninguém. E agora todos nós temos que pensar nela. Eu escrevo.
Fora a destinatária, ninguém leu a resposta de Dona Matilde. Isto é, ninguém leu antes. Leu depois que Maria se matou com um tiro no coração, numa pensão ordinária. Naturalmente, havia risos no salão e uma vitrola tocando, enquanto na rua, ao sol, os pregões cantavam alto. Foi de manhã, soube-se no inquérito. De manhã cedo, quando a cidade é alegre e ativa. Foi de manhã, quando de certas ruas, de certas casas, partem aos pares, gordas mulheres de cabelos tingidos e olhos pintados, apertando ao peito a bolsa da féria. Foi de manhã e a morte não fez muito ruído. Foi quase o mesmo que haver, dentro da pensão alegre, um pássaro morto.
Um curioso qualquer comentou que era tão bonita e parecia tão deslocada em tal lugar. A polícia mandou o aviso de praxe à família.
— Com um tiro no coração. Era bem dela. - Seu Zé Rodrigues suspirou.
Dona Matilde se aprontou, hostil e fechada.
— Zeca - disse ela. — Vamos buscar Maria.

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